Entenda os eventos climáticos extremos e sua relação com a emergência climática

Apesar de raros, eventos climáticos extremos tendem a ser mais comuns com a perturbação causada pelo aquecimento global; confira a entrevista com a professora Marina Hirota, da UFSC

Frio ou calor atípico, chuvas acima da média ou secas extremas estão cada vez mais comuns no cotidiano e, consequentemente, no noticiário. Essas mudanças acontecem em nível global e suas causas absolutas são de difícil identificação, mas têm influência tanto da variabilidade do clima quanto da emergência climática que, consensualmente pela ciência, é causada pela ação direta do homem.

O planeta está aquecendo e, segundo a ONU (Organização das Nações Unidas), a temperatura de equilíbrio pode aumentar até 2,7°C até o fim deste século, causando um desequilíbrio no sistema. Eventos extremos, como ciclones e calor próximo aos 50°C em países como índia – apesar de raros -, tendem a se tornar cada vez mais frequentes.

Essas mudanças causam uma série de perturbações no meio ambiente, como explica a professora do Departamento de Meteorologia da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) Marina Hirota Magalhães. Em entrevista ao ND+, a pesquisadora fala sobre esses eventos extremos e o que esperar deles com o aquecimento global.

Confira a entrevista:

ND+: O que são os extremos climáticos?

Marina Hirota:Extremos climáticos entram muito na variabilidade do clima natural, mas são eventos extremamente raros. Se fosse calcular a probabilidade deles ocorrerem seria em torno de 5%. Diria que em 95% do tempo ele não acontece e a gente tem chuva em uma determinada época, seca em outra, mas os extremos são difíceis.

É raro ver esses extremos mais de uma vez na vida. Se alguém vive bastante o suficiente, pode ver e lembrar. Tem muita gente que trabalha com isso, inclusive, resgatando a memória de pessoas mais antigas que vivem em diversas regiões e estão em contato próximo com a natureza.

São eventos que pegam todo mundo desprevenido. Mesmo que a gente tenha previsão e seja avisado de que vai acontecer, pode ser que não tenha estrutura: alaga ou seca muito, por exemplo.Marina Hirota é professora no departamento de meteorologia na UFSC e pesquisa os impactos do aquecimento global nos sistemas e meio ambiente – Foto: Arquivo Pessoal/ND

Marina Hirota é professora no departamento de meteorologia na UFSC e pesquisa os impactos do aquecimento global nos sistemas e meio ambiente – Foto: Arquivo Pessoal/ND

ND+: As pesquisas indicam que o aquecimento global pode tornar esses eventos extremos mais frequentes. Pode explicar um pouco dessa influência entre os dois fatores?

Marina Hirota: Normalmente, eu uso uma analogia para facilitar a explicação: imagine um lago de manhã bem cedo, sem vento e nada, bem lisinho. Quando começa a ventar ele vai criar ondinhas. Isso naturalmente acontece ao longo do dia e os seres que vivem dentro ou em volta do lago estão acostumados.

Agora, vamos pensar em um lago bem isolado onde uma pessoa vai, pega uma pedrona e joga no meio do lago. Do nada, ele vai ter um movimento, como uma onda, para vários lados.

Imagine então que, em cada um dos cantos do lago, tem uma pessoa jogando essas pedronas. Vai começar a gerar um monte de ondas que vão se encontrar e eventualmente bater uma na outra. Se muitas pessoas ficarem jogando pedra neste lago, o movimento não vai parar nunca. Não vai ficar lisinho, aquilo que se espera como equilíbrio.

As mudanças climáticas têm a ver com essa série de perturbações. Hoje são praticamente consensuais, dentro da comunidade científica, que é o homem causando isso. A gente está jogando na atmosfera um monte de gases e acelerando o efeito estufa da Terra, aumentando a temperatura de equilíbrio. Essa aceleração é a mesma coisa que um monte de gente jogando pedras no lago.

Isso são os eventos extremos: o sistema vai ficar todo bagunçado e vários lugares do lago vão chegar ondas que nunca chegaram. Até o lago estabilizar e voltar para um equilíbrio, você vai ter um monte de coisas acontecendo no ambiente.

A gente perturbou o sistema terrestre na atmosfera e está perturbando o entorno. A gente está mudando o oceano, a cobertura da terra. Tudo isso está acontecendo ao mesmo tempo. Isso tudo em uma escala global. Pensando em local, no oeste de Santa Catarina, por exemplo, você tem muito desmatamento e tem influência localmente para o clima, para as pessoas, para a agricultura e tudo.

ND+: Como vocês, pesquisadores, fazem para diferenciar o que acontece normalmente de ocorrência climática e o que é efeito extremo do aquecimento global? existe algum método para isso?

Marina Hirota: A gente tenta mas é muito difícil separar o sinal. É isso, imagina o lago: como é que a gente vai saber de qual pedra veio a onda? É muito difícil de saber. É separar duas pedras que atingiram o lago e ver qual delas causaram a perturbação. Tem umas técnicas para isso, mas nenhuma delas ainda me convenceu.

Existem pessoas tentando filtrar esses sinais e separar o que é de uma ou outra coisa. Fazem isso com as ferramentas que existem, como computacionais ou modelos matemáticos, e tentam atribuir o que é causado pelo aquecimento global ou variabilidade temporal. A gente tem que deixar claro que essas duas coisas vêm juntas em eventos extremos.

ND+: Santa Catarina tem passado por esses momentos de muita seca, ou muita chuva, se diferenciando bastante das médias históricas. Isso pode ser sinal deste aquecimento?

Marina Hirota: O grande lance é que 100% de certeza eu não posso dar. Mas eu diria que é uma combinação dos dois. Pode ser que, realmente, a gente esteja num momento que a variabilidade climática do planeta propicie essa esse tipo de extremo. Considerando tudo o que já foi mostrado de aquecimento global, é improvável que não exista um sinal desse aquecimento global nessa mudança que a gente observa.

Se você pega pessoas que nasceram em Florianópolis, por exemplo, que a gente [grupo de estudos] já entrevistou essas pessoas. A gente fala com pescadores artesanais antiguíssimos nas comunidades pescadoras e eles falam claramente dessas mudanças.

Não falam da chuva ou da temperatura, mas dizem que agora precisam buscar mais ajuda porque chove mais ou alaga e afins. Num horizonte de 100 anos para trás, o que acontece em Florianópolis é uma coisa que não se via antes nessas comunidades. Isso nos dá uma ideia, pelo menos, de que não é só uma variabilidade climática. Apesar de poder ser porque um horizonte de 100 anos não é nada comparado a história da Terra.

ND+: Quais são os efeitos práticos dessa mudança na vida das pessoas?

Marina Hirota:É um efeito desigual como sempre. As pessoas com maior poder aquisitivo vão conseguir se adaptar até um limite. Depois elas vão sentir também, mas elas têm tempo maior de tamponamento do efeito e conseguem se refazer. Eventualmente, se você não mora numa área de risco.

Em Florianópolis, sobre áreas de risco, não é tão desigual porque tudo é área de risco, desde o bairro mais caro até o bairro mais pobre. Então, não é só pela exposição, mas sobre lidar com os danos.

Acredito que a gente vai ter que arrumar um outro modelo de recuperação, que não seja o que temos hoje: fazendo mil doações pela internet. Para que essa desigualdade seja suprimida vamos ter que arcar com tudo isso e se adaptar. Há 40 ou 50 anos que a ciência fala com isso e não fizemos nada. Então, vai ter que ser na dor.

ND+: O mundo já aqueceu, como a gente pode evitar que ele aqueça mais?

Marina Hirota:Tem essas propostas de mitigação. Uma delas é ter um carbono líquido zero em vários níveis, que vão do municipal ao federal. O plano é existir emissão de carbono, mas absorver na mesma medida. Não é fácil fazer isso e a gente precisa de planos além das cidades. Sem coordenação federal é difícil que exista mudanças.

Outra forma é a descarbonização da economia. Países mais desenvolvidos emitem mais carbono e aqueles que estão em segundo lugar querem emitir tanto quanto pelo mesmo tempo que esses países na esperança de também se tornarem potências. Uma corrida mesmo.

Acredito também que em mudanças no nível individual. Só ando de bicicleta e as pessoas falam que isso não vai fazer diferença. Digo que, no mínimo, eu vou ficar mais saudável. Mesmo que eu não faça diferença sozinha, se eu for pelo menos exemplo de que há outras formas de se locomover sem emitir carbono, já vai ser bom.

As ações são importantes em qualquer nível, mas no individual é o que a gente mais consegue fazer a diferença neste momento. Ainda assim vai aquecer e o que é preciso fazer? Tirar carbono da atmosfera e isso é outro plano, ainda mais ambicioso porque envolve novas tecnologias que ainda estão sendo desenvolvidas, todas de investimento muito alto.

(NDMais)

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