Dra Paola Cecília Loeblein – Advogada
Quantas vezes ouvimos que a juventude está perdida. O acesso as drogas e à criminalidade se tornou muito mais intenso do que existia em tempos mais remotos.
Estudar a mente de um adolescente pode ser uma das coisas mais difíceis a se fazer. Época de explosões de hormônios e convicções, dão muitas vezes a impressão de que são na verdade adultos.
Mas não se engane caro leitor, noções como responsabilidade, honestidade, ética ainda estão em formação na cabeça de um garoto de 16 anos, por exemplo.
Ser adolescente é passar por uma transição entre ser criança e se tornar um adulto. É uma fase que não tem apenas mudanças físicas como o engrossar ou afinar de uma voz, mas sim toda uma explosão psicológica de um indivíduo que não mais se percebe como extensão dos pais.
Para se autoconhecer e entender o funcionamento da sociedade, o indivíduo precisa passar por experiências em sua vida. Digamos que a adolescência corresponde a versão demo do jogo da vida.
E são através destas experiências que o jovem adolescente pode acabar cometendo erros grandes, ferindo inclusive a lei.
Por não entender completamente a extensão de seu erro, como ele implicará em sua vida ou que existem outras maneiras de se viver, que nosso ordenamento jurídico busca apurar uma infração de maneira a não punir diretamente este adolescente, mas sim ensiná-lo as consequências de suas ações para que quando se torne um adulto não volte a cometer atos ilícitos.
Por conta disso, um indivíduo não comete crime até completar 18 anos, pois sua fase de desenvolvimento físico e mental ainda não está completa.
Mas não isso não significa que o adolescente não terá algum tipo de consequência em cometer atos que se encontram tipificadas no Código Penal ou Lei de Contravenção Penal.
Uma pessoa de tenha 18 anos completos, ao furtar um celular de uma, comete um crime de furto de acordo com o Código Penal e estaria sujeito à pena imposta na lei (reclusão de 1 a 4 anos e multa).
Mas, caso esta mesma pessoa for um adolescente de 15 anos, não cometerá crime, mas sim um ato infracional.
Como consequência, não será aplicada a pena de reclusão em seu desfavor, mas sim uma medida que possui finalidade educativa, em respeito à sua peculiar condição como ser humano em fase de desenvolvimento, sendo destinatário de proteção integral.
Deste modo, quando o adolescente comete o fato ilícito, um procedimento será instaurado, iniciando na delegacia e depois passando para o sistema judicial conhecido como apuração de ato infracional.
Partes da ação de apuração de ato infracional
No judiciário serão três partes que integrarão o processo, que serão:
- Ministério Público– Titular da ação, representa o interesse do estado e da sociedade na busca da verdade, será este órgão que entrará com o processo diante do adolescente, fiscalizará o andamento, auxiliará no processo de decisão da medida socioeducativa que irá ser aplicada caso se constate se realmente houve um descumprimento da lei;
- Adolescente– representado por seu guardião legal e por um advogado que protegerá seus direitos e interesses durante todo o processo;
- Juiz– será o juiz quem irá decidir sobre a existência do ato infracional, a autoria e aplicará a medida socioeducativa ao jovem infrator, assegurando seus direitos fundamentais, incluindo o direito à ampla defesa, à presunção de inocência, ao contraditório e à assistência jurídica.
Procedimento
Após juntar todas as provas do ato ocorrido, o Ministério Público entrará com uma petição chamada representação em desfavor do menor infrator, que deverá ser aceita ou não pelo juiz.
Sendo aceita, o juiz irá determinar a citação do menor, ou seja, que ele tome conhecimento do processo para comparecer em uma audiência, onde o adolescente terá a oportunidade de contar sua versão dos fatos para o juiz (audiência de apresentação).
Esta audiência é obrigatória, não poderá o menor infrator deixar de comparecer ao ato sob pena de ser conduzido pela polícia até o juiz. Caso o menor não tenha um advogado, o juiz nomeará um para representa-lo tanto na audiência como no restante do processo. Nesta audiência, caso seja comprovada a não ocorrência do ato ou que não foi o menor quem o praticou, poderá o juiz de pronto reconhecer tal situação e extinguir o processo.
Caso não seja esta a situação, o juiz abrirá prazo após a audiência para que o advogado apresente a defesa prévia, uma petição trazendo argumentos, provas e justificativas para rebater a representação que o Ministério Público fez.
Após isso, será designada uma nova audiência para ouvir as testemunhas, vítima e assistentes técnicos quanto ao fato e por fim será aberto prazo para que tanto o Ministério Público quanto o advogado de defesa apresentem as alegações finais, que é o momento em que as partes têm a oportunidade de fazer suas últimas considerações, recapitular os pontos principais do caso e persuadir o juiz sobre sua versão dos fatos e a aplicação correta da lei.
Por fim, será proferida a sentença, que poderá constatar a inexistência do ato infracional praticado pelo adolescente, ou condená-lo ao cumprimento de uma medida socioeducativa.
Este procedimento narrado é padrão do judiciário, descrito no Estatuto da Criança e do Adolescente, sendo exposto aqui de maneira resumida. Poderá haver algumas alterações de acordo com o caso, sempre respeitando a lei. Em caso de dúvidas, consulte um advogado de sua confiança!
Tipos de medida sócioeducativas
As medidas socioeducativas irão variar de acordo com a gravidade do ato praticado pelo menor, pela sua reincidência na prática de atos ilícitos e das condições pessoais do caso, podendo ser aplicadas as seguintes medidas:
- Advertência: consiste em uma bronca do juiz e geralmente será aplicada para casos com menor gravidade ou como medida inicial.
- Prestação de serviços à comunidade: o adolescente é direcionado a prestar serviços de caráter não remunerado e instituições públicas ou entidades assistenciais. O objetivo é incentivar o adolescente a participar de atividades comunitárias e promover seu senso de responsabilidade.
- Liberdade Assistida: o adolescente será acompanhado por um orientador socioeducativo, que irá monitorar seu cumprimento de determinadas condições como frequência escolar, proibição de frequentar certos lugares ou manter contato com pessoas prejudiciais, auxiliar e questões pessoais e profissionais. Visa proporcionar ao adolescente apoio em ambiente familiar e social.
- Semiliberdade: o adolescente cumpre a medida em uma unidade de semiliberdade durante o período diurno, onde participa de atividades educacionais, profissionalizantes e socioeducativas. Durante a noite e fins de semana, retorna para convívio familiar.
- Internação: é a medida mais restritiva que será aplicada em casos mais graves. O adolescente é internado em estabelecimento socioeducativo onde recebe atendimento e acompanhamento especializado, além de participar de atividades educacionais e profissionalizantes. O período de internação pode variar entre 6 meses à 3 anos, de acordo com a necessidade.
É importante destacar que o objetivo das medidas socioeducativas é educar, ressocializar e proporcionar oportunidades de desenvolvimento ao adolescente infrator, evitando sua estigmatização e buscando sua reintegração à sociedade de forma positiva. As medidas são definidas levando em consideração a gravidade do ato infracional, o perfil do adolescente e a necessidade de proteção da sociedade.
Os adolescentes e jovens adultos precisam se perceber enquanto indivíduos que
possuem deveres tanto quanto possuem direitos, cabendo à família, a sociedade e ao poder público garantir as condições para o exercício da sua cidadania, dando
oportunidade para restabelecimento de laços sociais e da dignidade quando forem
necessários.
Salienta-se que, não significa praticar a impunidade, mas sim, dar a eles a chance
de reparar e aprender sobre o impacto de suas ações na sociedade.
Referências Bibliográficas:
RABELLO, Fabio. O que é um ato infracional e quais as suas consequências. Jusbrasil. 2020. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/o-que-e-um-ato-infracional-e-quais-as-suas-consequencias/1139127174. Acesso em: 20/06/2023
BRASIL. Lei n. 8069 de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em: 18/06/2023.